Meu gosto por música é hereditário.
Mãe muito afinada, bela voz. Pai idem.
Ele se apresentava quando jovem, gravou alguns jingles –
participei de pelo menos um quando criança – e chegou a montar
um quarteto vocal despretensioso, formado por ele (voz e violão)
e os três filhos. Nós nos apresentamos nos Jogos Florais de Juiz
de Fora, na década de 1960.
Acho que devo citar os nomes de meus pais e meus irmãos, que acabo de envolver na história. Além disso,
não seria justo com você, que está lendo, eu não explicar estes nomes:
Darcylia, minha mãe, pernambucana. Os amigos a chamavam de Cyla. Podemos encontrar na Internet alguns
milhares de referências a mulheres com esse nome, que não é tão incomum.
Dormevilly, meu pai, que os amigos chamavam de Vivi, deve ter escolhido uma Darcylia de propósito.
Afinal, os dois nomes começam com D e têm ípsilon em algum lugar. Por que esse nome? Meu avô José
admirava muito um libretista italiano, mas de ascendência francesa, chamado Carlo D’Ormeville.
Foi ele que concluiu o libreto da ópera “O Guarani”, do compositor brasileiro Carlos Gomes.
Quando foram registrar o nome de meu pai, alguém trocou o apóstrofo inicial por um ípsilon no
fim, e ele virou Dormevilly. A pronúncia era pra ser “dormevíe” mas passou a ser “dormevilí”.
Sejamos honestos: as duas opções eram estranhas...
Meus irmãos: Dormevilly Júnior (meu pai gostou mesmo do nome!) e Daury. Todos com D e Y. Meu nome, além de
se compor com os outros, veio de um conto policial que meu pai escreveu, cujo herói se chamava Daltony –
a pronúncia é oxítona porque naquela época era enorme a influência francesa no Brasil.
Eu me dediquei à música por pura inveja de dois amigos que tocavam violão: José Renato e Antônio Carlos.
Achei aquilo o máximo e peguei o violão de meu pai para tentar aprender. Mergulhei de cabeça e não quis
mais saber de outra vida. Depois de um tempo, quando me senti seguro, montei um grupinho vocal com duas
amigas: Márcia e Norma. Chegamos a nos apresentar em um programa de rádio. Era para participarmos regularmente,
mas os pais temiam que isso interferisse nos estudos e o grupo se desfez. Mais ou menos nessa ocasião,
meu pai me deu meu primeiro violão, o “Ernesto Pinho di Giorgio”, que tenho até hoje.
Logo surgiu outra oportunidade, que definiu meu caminho: um dia, meus amigos Paulo Augusto e Ricardo me
pediram o violão emprestado porque tinham conhecido um cara que compunha e queriam ouvi-lo. Era um mineiro
de Carangola, Sebastião Wellington da Silva, de apelido Lilito. Emprestei morrendo de medo de machucarem o
violão, mas no dia seguinte ele voltou intacto. Disseram que foi ótimo, que o cara era legal e que as
músicas dele eram simplesmente ótimas. Fiquei aliviado, mas, dali a uma ou duas semanas, eles me pediram de novo.
“Só se eu for junto”, respondi. Fiz muito bem. Ouvindo o Lilito cantar com uma enorme alegria e um talento
incomum, vi que aquele era o caminho. Acabamos montando um quinteto vocal, com Lilito e eu nos violões,
Paulo Augusto de Oliveira Pinto na percussão, Ricardo Scapim Barroso e Octavio César Cavalcanti
(piauiense, mas pra nós mineiro honorário).
Nesse meio-tempo, três de nós participamos da peça “O Coronel de Macambira”, de Joaquim Cardoso, em versão
musicada por Maurício Tapajós, mistura de gênio e gentleman. Meu papel era o de violeiro. Na mesma época
trabalhei no “Cancioneiro de Lampião”, de Nertan Macedo, músicas da genial Sueli Costa, amiga querida.
Meu papel também era de cantor e violeiro.
Em julho de 1968, deu a louca no Paulo Augusto e ele resolveu se mudar para o Rio de Janeiro. Gostei da ideia, e lá fomos nós, com a cara, a coragem e uma grana dada por Ilo Encantamento e Helena Maravilha. Explico isso no trecho COMPOSITOR. Queríamos viver de música com nosso conjunto, o Grupo Mineiro. Como acontece muito nessa área, o Paulo e o Ricardo não demoraram a largar a música. Paulo se tornou contato de publicidade e Ricardo, aviador. No lugar deles entrou o Fotóti, também mineiro. O quinteto virou quarteto.
Com esse formato, participamos de alguns discos (Marlene, Luiz Cláudio...), shows (Marlene É a Maior,
Beth Carvalho na Boate Grinzing...) e festivais, defendendo músicas de Ivan Lins, Taiguara (com Agostinho dos Santos),
Artur Verocai (com Dorinha Tapajós) e nossas próprias músicas em festivais de Juiz de Fora e Viña del Mar, no Chile.
O show Marlene É a Maior ficou um ano em cartaz. O Grupo Mineiro durou uns cinco anos e então cada um foi para o
seu canto. Fotóti se mudou para a França, Lilito abraçou a Administração, Octavio foi trabalhar como humorista na
Globo (programa do Jô) e eu misturei música com outras áreas.
Em 1978, um fato marcante: um show na Funarte, que lotou todas as noites, com músicas de Mario Martins, Annamaria e minhas. Mario, ótimo porém desconhecido, era irmão de Annamaria. Esta era minha esposa na época e é mãe de minhas três filhas. Os arranjos dos shows eram do Mario e meus. Ainda em 1978, participei de “O Dragão e a Fada”, peça musical infantil de Carlos Lyra, em que eu era...
o dragão, é claro. Não tocava, mas cantava.
No início dos anos 1980, o desenhista Stil e eu criamos e produzimos um musical infanto-juvenil que foi encenado no Oba-Oba, Rio de Janeiro, estrelado por atores/cantores mirins.
Toquei violão em uns poucos discos, inclusive nos meus, mas não é minha praia. Os músicos de estúdio são a
nata da musicalidade, em todos os sentidos. Estou longe disso.
Depois, como Diretor Musical da Linha de Shows da TV Globo no Rio e, em seguida, da Rede Bandeirantes em São
Paulo, escrevi mais esboços do que arranjos, só para facilitar os arranjadores fantásticos e extremamente
versáteis que trabalhavam lá. Para citar só um nome em cada oportunidade: Guio de Moraes na Globo,
José Paulo Soares na Band e, onde quer que fosse, Chiquinho de Moraes. Dediquei uns 23 anos às tevês.
Atualmente, só uso o violão como veículo para minhas canções. Sempre me considerei mais compositor e contador
de histórias do que instrumentista.
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